sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

A emergência da Retórica


Texto 1 - O Despertar da Oratória

Desde sempre os gregos foram inveterados amantes da palavra, apreciando a eloquência natural mais do que qualquer outro povo antigo. A comprová-lo estão os brilhantes discursos que enchem as páginas da Ilíada e as fervorosas palavras que os comandantes militares dirigiam às suas tropas antes de entrar em combate. Os próprios soldados caídos na guerra eram logo honrados com solenes discursos fúnebres. Mas foi com o advento da democracia que esse interesse pela eloquência e oratória cresceu de uma maneira explosiva. Compreende-se porquê: o povo - onde não se incluíam, nem as mulheres, nem os escravos, nem os forasteiros - passou a poder reunir-se [, na Ágora,] em assembleia geral para tratar e decidir de todo o tipo de questões. Assembleia geral que era ao mesmo tempo o supremo órgão legislativo, executivo e judicial. Nela se concentravam os mais altos poderes. Podia declarar a guerra ou a paz, alterar as leis, outorgar a alguém as máximas honras mas também mandá-lo para o exílio ou condená-lo à morte. Tratava-se de reuniões públicas e livres, pois todos os cidadãos podiam assistir, participar e votar. Logicamente, os que melhor falavam eram também os mais influentes. Logo, quem aspirasse a ter alguma influência nessas assembleias, forçosamente teria de possuir assinaláveis dotes oratórios. (...)

Definitivamente, o saber defender-se com a palavra, passou a ser uma parte essencial da educação e cultura geral grega. E Aristóteles [,na sua obra Retórica], explica porquê: "se é vergonhoso que alguém não possa servir-se de seu próprio corpo [para se defender], seria absurdo que não o fosse no que respeita à razão, que é mais própria do homem do que o uso do corpo”. É certo que uma das maiores acusações que Platão fizera à retórica tinha sido a de que esta poderia trazer graves consequências quando alguém dela se servisse para fazer o mal, mas Aristóteles riposta categoricamente, lembrando que "se é certo que aquele que usa injustamente desta capacidade para expor razões poderia causar graves danos, não é menos certo que isso ocorre com todos os bens, à excepção da virtude, sobretudo com os mais úteis, como o vigor, a saúde, a riqueza ou a capacidade militar, pois com eles tanto pode obter-se os maiores benefícios, se usados com justiça, como os maiores custos, se injustamente utilizados”.

|Américo de Sousa, http://www.persuasao.com/trechos.htm.



Texto 2 - A Pólis

“A polis grega ou cidade-Estado é um dos elementos fundamentais da civilização grega, resultante da conjugação de um conjunto variado de factores. Ela nasceu de factores de ordem geográfica, de uma instabilidade gerada depois da invasão dórica, e da falta de um poder centralizado defensor dos indivíduos, que os levou a unirem-se em pequenos territórios.<…>

Os Gregos viviam nas polis, e estavam somente sujeitos às suas leis, o que para eles era decisivo para os distinguir dos povos bárbaros. A polis era, também, um sistema de vida e, portanto, um modo de formar e moldar os cidadãos gregos que dela faziam parte. Este conceito está sintetizado nas palavras de Simónides: "A polis é mestra do homem".<…>

Este espaço físico para além deste aspecto individualizado, continha uma série de edifícios públicos, presentes em qualquer cidade do mundo helénico. Os templos dedicados aos deuses eram indispensáveis; a Ágora, ou praça pública, onde se exerciam actividades ligadas ao comércio; as dependências dos magistrados, e uma cidadela (Acrópole).

A cidade vivia de uma economia de base agrária, e nela estavam contempladas as três divisões do poder, distribuídas pelas actividades legislativa, judicial e administrativa<…>

A Assembleia Popular, o Conselho e os tribunais formados pelos cidadãos eram três aspectos significativos da vida quotidiana da polis ateniense que caracterizavam este original sistema, no qual a participação na coisa pública era exercida rotativamente. Assim se manteve este regime político democrático até à época helenística.”

|http://www.infopedia.pt/$polis-da-grecia-antiga



Texto 3

A origem da polis a partir do século VIII a.C., com o renascimento do comércio, acaba com o isolamento das aldeias. A sociedade torna-se mais complexa. As cidades sofrem mudanças radicais. O local mais importante da cidade passa a ser a "Ágora", a praça pública, onde o comércio se desenvolve e as discussões sobre a vida e a sociedade acontecem.

A democracia contribuiu para que "todos" tivessem acesso à Ágora, de modo que cidadania passou a ser um direito dos homens adultos e que não fossem estrangeiros ou escravos.

Essa nova forma de pensar a partir da formação da Pólis é o oposto ao pensamento mítico. É como se o homem grego do século VI a.C. se tivesse libertado das fantasias da religião e da mitologia para evoluir racionalmente.

A Pólis grega, criação da vontade dos homens, estabelece o desaparecimento da vontade divina e celestial de todo um conjunto de relações, quer dos homens entre si, quer dos homens com a Natureza. A mitologia apenas narra, de forma poética e fantasiosa, uma sucessão de fenómenos divinos, naturais e humanos.

Ela é, então, substituída pela Filosofia na compreensão desses fenómenos. Com isso, ao utilizar a Razão, o homem busca uma explicação para entender a relação entre o caos e a ordem do mundo.

|http://www.mundovestibular.com.br/articles/2432/1/A-EVOLUCAO-DA-POLIS-GREGA-E-A-RAZAO/Paacutegina1.html



Texto 4

Os sofistas viveram numa época áurea da cultura grega. O século de Péricles onde a democracia em Atenas desenvolveu intensa vida cultural e artística.Sofista etimologicamente significa dizer apenas "intelectual que sabe falar". Posteriormente adquiriu um sentido pejorativo de "alguém que usa de raciocínio capcioso, de má-fé, com intenção de enganar".

Ao longo dos anos, os sofistas sempre foram mal interpretados devido a críticas feitas por Sócrates e Platão. Segundo estes filósofos, a Filosofia não se deve basear na doxa, na opinião, mas deve constituir-se como episteme (ciência), ou seja, como saber racionalmente fundamentado e empiricamente comprovado. A verdade deve ser a principal preocupação dos filósofos, o que leva à rejeição da argumentação retórica e do relativismo defendido pelos sofistas, para quem não há opiniões verdadeiras, mas apenas opiniões defendidas de forma competente.

Sábios e pedagogos, os sofistas contribuíram muito para o ensino. Formaram um currículo de estudos que foi resgatado no período medieval.

Talvez o que mais escandalizava os seus contemporâneos seja o facto de que eles se faziam pagar pelas suas aulas, muitas vezes exigindo somas muito elevadas aos seus alunos e, por isso, Sócrates acusava-os de prostituição. <…>

Ensinavam a arte de argumentar e persuadir, indispensável para exercer a cidadania numa democracia directa. Também davam aulas de retórica, que consistia em defender e a atacar com argumentos de igual força o mesmo assunto. Isso dava impressão de serem egoístas e sem credibilidade moral. Isto era reforçado pela sua afirmação cívica da lei do mais forte, o que parece que leva à instituição da democracia como um espaço político onde predominaria a lei da selva: os mais poderosos vencem sempre os mais fracos. Mas talvez o que os sofistas fizeram foi demonstrar que o poder da argumentação se sobrepõe a qualquer tipo de imposição dogmática, o que terá contribuído para o desenvolvimento da racionalidade em áreas que ficariam por explorar se a esfera pública ficasse inteiramente entregue a filósofos como Platão que, como ficou bem patente na sua obra A República, era contra a democracia.

É graças aos sofistas que o ‘povo’, enquanto auditório a que se dirigiam os seus discursos, ganhou consciência de si, dando origem a algo que hoje denominamos como opinião pública. (Texto adaptado)

| http://minhafilosofia.blogspot.com/2009/06/socrates-e-os-sofistas.html (Este site não deve ser consultado devido à fraca qualidade da escrita).



Texto 5

“Os sofistas preocupavam-se, não com os valores que constituem a humanidade da conduta humana, mas com a utilidade da sua doutrina e da sua técnica para os indivíduos, especialmente na vida política.<…>

A existência da escolaridade depende do livro, e o seu uso tornara-se vulgar durante o século V, especialmente através dos escritos dos sofistas. A literatura grega anterior tinha por base a tradição oral, tendo que ser recitada e escutada.

As suas várias actividades no campo da literatura foram baseadas apenas na observação e experiências práticas. Não pode existir qualquer dúvida acerca da sua própria eficiência e no seu entusiasmo em esclarecer outras mentes. Eles deram uma contribuição decisiva para o desenvolvimento do livro, de cuja emergência e existência a escolaridade dependeu. <…>

A virtuosidade retórica teve como resultado imediato as suas análises da linguagem e os seus estudos "críticos" da literatura. O seu amor genuíno pela linguagem influenciou gerações que começaram pesquisas mais sérias. Finalmente, se tiveram que acumular uma vasta sabedoria para as suas próprias performances e para a instrução de alunos, tais colecções tornaram-se sugestivas para estudos posteriores. Mas todos os seus esforços, consideráveis como foram, tiveram um carácter mais ou menos arbitrário e casual.”

|Rudolf Pfeiffer, “Os sofistas, seus contemporâneos e alunos nos séculos V e IV”.


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