quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Os diversos tipos de valor




Os valores

Como todos os valores se acham referidos a um sujeito – o sujeito humano, o homem - e este é, antes de mais nada, um ser constituído por sensibilidade e espírito, daí o poderem classificar-se imediatamente todos os valores nas duas classes fundamentais de: valores sensíveis e valores espirituais. Os primeiros referem-se ao homem enquanto simples ser da natureza, os segundos ao homem como ser espiritual.

A – Valores sensíveis
A esta categoria pertencem:

1 – Os valores do agradável e do prazer, também chamados “hedónicos”. Ela abrange não só todas as sensações de prazer e satisfação, como tudo aquilo que é apto a provocá-las (vestuário, comida, bebidas, etc.). À ética que apenas conhece estes valores chama-se geralmente hedonismo.

2 - Valores vitais ou da vida. São aqueles valores de que é portadora a vida, no sentido naturalista desta palavra, isto é, Bios. Cabem aqui o vigor vital, a força, a saúde, etc. Como se sabe, foram estes os valores que Nietzsche reputou os mais elevados de todos na sua escala axiológica, como os únicos mesmo. E ao que se chama biologismo ético ou naturalismo.

3 - Valores de utilidade. Coincidem com os chamados valores económicos. Referem-se a tudo aquilo que serve para a satisfação das nossas necessidades da vida (comida, vestuário, habitação, etc.) e ainda aos instrumentos que servem para a criação destes bens. Distinguem-se dos restantes valores desta classe, nomeadamente dos sensíveis, para os quais aliás concorrem, por não serem, do ponto de vista formal, autónomos, mas derivados, no sentido que acima vimos.


B – Valores espirituais.
Estes distinguem-se dos valores sensíveis, no seu conjunto, não só pela imaterialidade que acompanha a sua perdurabilidade, como pela sua absoluta e incondicional validade. Muitos filósofos, que encaram os valores só por este último lado, identificando-os por isso com o conceito de simples “valor” ou validade formal, pretendem que só os valores espirituais são verdadeiros valores.Porém, quem se lembraria de negar aos economistas o direito de usarem também do termo e do conceito de valor? À categoria dos valores espirituais pertencem:

1- Os valores lógicos. Quando se fala de valores lógicos, é preciso ter presente que se podem entender por esta expressão duas coisas distintas: a função do conhecimento – o saber, a posse da verdade e o esforço para a alcançar - e o conteúdo do conhecimento. No primeiro sentido, é óbvio que podemos falar, com todo o direito, em valores lógicos ou no valor do conhecimento. Contrapor-se-lhe-ão, como desvalor lógico, a ignorância, o erro, a falta de interesse pela verdade, a ausência de esforço para a alcançar, etc. Mas a expressão “valor lógico” pode significar também o próprio conteúdo do conhecimento. E, neste segundo caso, é “valor lógico” tudo aquilo que cai dentro do par de conceitos verdadeiro-falso [...].


2 - Valores éticos: ou do bem moral. Destes podem dar-se as seguintes características:


a) Só podem ser seus portadores as pessoas, nunca as coisas. Só seres espirituais podem encarnar valores morais. Por isso o âmbito destes valores é relativamente restrito; muito mais, por exemplo, que o dos estéticos.


b) Os valores éticos aderem sempre a suportes reais. Também, por este lado, se distinguem dos valores estéticos, cujo suporte é constituído por algo de irreal, de mera aparência.


c) Os valores éticos têm o carácter de exigências e imperativos absolutos. Dele desprende-se sempre um categórico “tu deves fazer” ou “tu não deves fazer”, "isto ou aquilo"; exigem, imperiosamente, que a consciência os atenda e os realize. E nisto se separam também dos estéticos que não impõem nenhuma exigência desta natureza, nem se nos impõem incondicionalmente. 

d) Os valores éticos dirigem-se ao homem em geral, a todos os homens; são universais, a sua pretensão a serem realizados é universal. Os estéticos não estão neste caso, apenas dirigem o seu apelo a alguns homens, para que estes os realizem, e nem todos podem ser obrigados a dar-lhe acolhimento, a fazer arte, ou a cultivá-las de qualquer maneira. 
e) Além disso, é, pode dizer-se, ilimitada também a exigência que os valores éticos nos fazem: constituem uma norma ou critério de conduta que afecta todas as esferas da nossa actividade e da nossa conduta da vida. Esta acha-se sujeita, total e incondicionalmente, a eles na sua imperiosa jurisdição e validade. Nada deve ser feito que os contrarie. Poderia definir-se esta característica dos valores éticos chamando-lhes totalitários. Não assim os valores estéticos. Estes só reclamam de nós que os realizemos em certas situações e momentos da vida, permanecendo calados durante os restantes; não somos obrigados a ser estetas e, menos ainda, a toda a hora (…).


3 - Valores estéticos, ou do Belo. Incluímos aqui no conceito de belo, no mais amplo sentido desta palavra, o sublime, o trágico, o amorável, etc.


4 - “Valores religiosos ou do”sagrado”. Já atrás aludimos ao que há de original nestes valores. A eles não adere propriamente nenhum “deve ser”. Não temos que realizar esses valores; nem isso é possível nem necessário. Não são valores de um “deve ser”, mas valores de um “ser”; Nisto se afastam dos valores éticos para se aproximarem dos estéticos com os quais estão numa relação muito íntima. Todavia, existe também entre eles e estes últimos uma diferença que cumpre salientar: a realidade do “sagrado”, não é, como a do “Belo”, apenas uma realidade aparente, mas uma realidade no mais eminente sentido desta palavra.

Johannes Hessen, Filosofia dos Valores, Ed. Arménio Amado; Coimbra. pp. 107-117
Texto recolhido aqui
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Glossário:

Sensibilidade - Refere-se à dimensão material do ser humano, relacionada com o conhecimento sensível (ou sensorial), relacionado com os sentidos. Neste sentido, é sensível o que é conhecido através dos sentidos (audição, tato, visão, paladar, olfato).
Por outro lado, a sensibilidade também se refere à dimensão emocional (emoções) e sentimental (sentimentos) do ser humano: as emoções são reações orgânicas aos estímulos do meio, dependem do corpo. Os sentimentos para além duma componente emocional, têm uma componente intelectual, pois integram padrões de pensamento que influenciam a tomada de decisões. Enquanto as emoções são reações de curta duração, os sentimentos prolongam-se no tempo, podendo marcar de forma profunda a personalidade dos indivíduos.
Hedónico - Esta palavra tem origem no termo grego hedonê que significa prazer, servindo, também, para designar a deusa do prazer. Assim, hedónico refere-se a tudo o que está relacionado com o prazer.

Atividades:

- De acordo com o texto:
1. O que são valores sensíveis?
2. O que são valores espirituais?
3. Qual a relação entre os valores e a natureza humana?

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